Lembranças da infância

Natal chegando e eu me lembro de como era quando criança. Lembro que as bolas de Natal eram de um vidro muito fino. Minha mãe pegava alguma galha grande (não sei porque acham que falo de galho verde... galha, para mim, sempre foi o galho seco), cobria com o algodão, esticando bem. As caixas de fósforo, a gente encapava com restos de papéis de presente. Viravam uns mini presentes... eu adorava. E essa era a minha árvore de Natal. Nada contra os pinheiros, de verdade ou plástico, mas a de galha era muito mais legal.

Não tinha aquelas ceias fotográficas, com frutas caras, pernil ou chester. A gente assava frango mesmo. E era o máximo! Mas, era um frango grande. Nada de frango raquítico! Não me lembro de ter salada de bacalhau (fui descobrir isso na ceia dos outros anos depois). Raras vezes tinham uns bolinhos de bacalhau... bons!! Mas, tinha uma maionese e uma farofa de lamber os beiços. Tinha manjar de coco e um doce preto e branco como sobremesas. Eu amava os dias festivos por causa desses doces. Até hoje a dona Ana se recusa a me passar as receitas.

Para vocês que implicam com a uva passa, essa era a época do ano que eu a via. Amava o pão de Natal que a Tia Preta fazia. A-MA-VA! Amava bagunçar a cozinha dela. À propósito, cozinha bem até hoje. Rabanada sempre tinha! Sempre!

Era criança pulando na sala. E não tinha essa de a ceia ser servida depois da meia-noite (nada de matar as crianças de fome... elas podem pôr a casa abaixo). A maioria dos convidados chegava, se o frango estivesse pronto, já poderia se servir. Sem olho grande porque era para todo mundo. E o cheiro de molho de laranja no frango era tão bom...

Durante o ano, raramente minha mãe deixava a gente dormir tarde. O Natal era emblemático porque eu podia assistir à Missa do Galo na tv. Não entendia bem o significado, mas ficava feliz de contar que dormi tão tarde que assisti àquela Missa inteira.

Eu não sabia direito os significados de solidariedade e espírito natalino. Embora soubesse na prática ao ver ações como "Brasil sem fome" (tinha até um funk: Se Deus é brasileiro, Betinho é a razão). Em casa conheci a coisa de que se nem todos têm, não pode ser bom. A gente não tinha muita coisa, mas ganhava algo no Natal. Então, a minha mãe abria o armário para a gente escolher o que estivesse bom e bonito (velho e rasgado só serve para pano de chão).

-- Mãe, essa saia é tão bonita. Eu gosto dela. Ganhei tem pouco tempo!
-- Fulana nem presente de Natal vai ganhar. Você não acha que ela merece uma saia bonita também?
-- Acho sim!

Então, sinto estranheza quando vejo pessoas apegadas a objetos e roupas que nem usam (nem usarão!). No mínimo, uma vez ao ano a limpa daqui preenche o armário do que tem menos.

Outra coisa que não entendo é o tal do "Paladar infantil". De criança, lembro o prato com batata doce, beterraba, cenoura, aipim (cozido... nham!), cará, inhame, abóbora, vagem, feijão verde (e outras cores), milho cozido, arroz, e as tais carnes de segunda, ou o carré, ou a galinha. Batata frita minha mãe fazia quando se animava a cortar no estilo da Ruffles. Pensa na decepção quando percebi que a tal Ruffles nem gosto de batata tinha direito. McDonald's só comi mesmo quando meu primo voltou para o Rio. Era algo vez e nunca. Achava mais legal meu irmão ou meu tio prepararem os hambúrgueres do que ficar naquela fila. A fila era para, no máximo, comprar sorvete (hoje em dia, acho aquilo insuportavelmente doce).

Mangas (de sete tipos), caju,pitanga, coco, jamelão, goiaba (aquela mesmo que dava bichinho!), jaca, amêndoas (a gente chamava de coquinho), abacate (jogado pelas crianças da vizinhança) eram da nossa dieta também. Delícias! E eu bem aceito doações, pessoas!

Brigadeiros, beijinhos e cajuzinhos não tinham conotação gourmet. Mas, apareciam nas mesas nas festas de aniversário. Vinham amigos, amigos dos amigos, e uma galera que a gente não fazia ideia de onde era, mas virava amigo na hora. Além do bolo (o melhor glacé era a tia Preta que fazia), cachorro quente e bala de coco... confesso que não me lembro de ter aquelas salgadinhos fritos. Nunca fizeram falta.  Tinha refir também (quem diria que não suporto mais refrigerante?) para as crianças e cerva para os adultos.

Refrigerante também aparecia em dias de churrasco. E como achava aqueles dias bons. Tocava Clara Nunes no toca discos, e, se desse sorte, Nelson Gonçalves passava batido (tenho trauma dos discos dele). Arroz, farofa, maionese, e eu e meus irmãos correndo de um lado para o outro.

A casa era quente, mal ventilada, volta e meia entrava vaga-lume, aranha, barata, cigarra (para o meu desespero), morcego perdido. A gente pulava na cama, corria na chuva, e, por alguma proteção divina, a gente não se arrebentou tanto quanto a gente merecia. Aliás, a eletricidade era um dos poucos medos. Menos para o Allan... Não éramos fáceis. Não mesmo! Como mãe nos aguentava? Não faço ideia!

Só me lembrei disso nessa época...


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2 comentários:

Diego Silva disse...

Só não gostei do que falou sobre sorvete. Até hoje é uma das minhas fraquezas

Tatiana Maria disse...

Eu gosto de sorvete, mas não mais os dessas lanchonetes famosas.

Enquanto um pedaço de mim é feito de carne e lógica, o outro possui emoções que às vezes necessitam de um meio, de uma porta-voz. E assim, e aqui as expresso...